Coparticipação do plano de saúde vira problema para clientes
Uma pesquisa sobre a oferta de benefícios pelas empresas mostrou que, atualmente, os consumidores estão gastando mais com o plano de saúde. O motivo é a maior adoção de planos de saúde que preveem pagamento de coparticipação, que é aquele em que o consumidor arca com parte do custo de cada atendimento médico. De 2023 para 2024, o número de empresas que oferecem assistência médica aos seus empregados e adotam a coparticipação, por exemplo, aumentou de 52% para 65%.
Os dados são “Pesquisa de Benefícios de Saúde e Bem-Estar 2024”, feita pela corretora Pipo Saúde, em parceria com a MIT Management Sloan Review Brasil, da universidade Massachusetts Institute of Technology (MIT), dos Estados Unidos. A pesquisa entrevistou 800 mil colaboradores de 536 empresas de 17 segmentos. Além disso, a terceira edição da publicação revelou que mais empresas exigem que o trabalhador contribua com o custeio do plano de saúde. O número de empregados que pagam parte do plano passou de 40% em 2023 para 55% em 2024.
Planos de saúde com coparticipação
O professor da pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar da USP de Ribeirão Preto e advogado especialista em plano de saúde, Elton Fernandes, explica que é cada vez mais comum as operadoras de saúde venderem planos com coparticipação. “Existem estudos realizados pelos planos de saúde que mostram que a cobrança de coparticipação diminui o número de exames e de consultas, pouco importando o valor pago pelo consumidor. Ou seja, a existência de coparticipação, por si, já torna o consumidor mais reticente em utilizar os serviços”, relata.
Do lado das empresas, a adoção da coparticipação aumentou, principalmente, após a pandemia, como uma forma de cortar custos. Uma pesquisa realizada pela Aliança de Saúde Populacional (Asap) em parceria com a Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH) indicou uma expansão de 59% para 72% das empresas brasileiras que aderiram ao sistema da coparticipação nos planos de saúde entre 2017 e 2020.
O advogado Elton Fernandes alerta, porém, que a coparticipação, em alguns casos, pode ser bastante onerosa ao consumidor como, por exemplo, quando há a cobrança sobre o valor de medicamentos. “Vejo todos os dias consumidores desesperados com a cobrança de coparticipação sobre medicamentos e, note, atualmente o STJ, Superior Tribunal de Justiça, tem validado cláusulas de coparticipação de, às vezes, até 50% sobre o custo de determinado medicamento”, relata.
Justiça valida coparticipação nos planos de saúde
Decisões recentes do STJ sobre o tema mostram tendência de validação do modelo de coparticipação nos gastos em saúde pelos consumidores. Em julgamento recente no REsp 2.001.108, os Ministros entenderam que “a contratação de coparticipação para tratamento de saúde, seja em percentual ou seja em montante fixo, desde que não inviabilize o acesso ao serviço de saúde, é legal”. No mesmo julgamento, a 3ª Turma do STJ também estabeleceu o limite máximo de coparticipação de 50% do valor contratado entre a operadora e o prestador de serviço.
De acordo com Elton Fernandes, os magistrados entendem que, como o consumidor paga mais barato pelo plano de saúde com coparticipação, não pode reclamar quando existe a cobrança extra sobre os serviços. “Isto, contudo, não enfrenta o argumento central que é o fato de que a coparticipação de 50%, como alguns planos de saúde impõem, oneram excessivamente o consumidor e terminam por prejudicar o acesso à saúde”, analisa.
O especialista em Saúde lembra que alguns medicamentos antineoplásicos, utilizados para o tratamento do câncer, custam mais de mil reais por dia de tratamento. “Como o consumidor vai conseguir pagar a mensalidade do plano de saúde e, ainda, 50% de coparticipação sobre o valor de um medicamento deste tipo?”, indaga.
As operadoras, por sua vez, alegam que diante dos custos crescentes, a adoção da coparticipação é a melhor forma de enfrentar a escalada de custos. Em 2018, a ANS editou medidas para regulamentar a cobrança de coparticipação, isentando a cobrança em exames preventivos, tratamentos crônicos e, inclusive, sobre quimioterapia. Contudo, como a regra também previa a possibilidade de a operadora estabelecer coparticipação e franquia de até 50% dos custos, a regra fora liminarmente suspensa pelo STF e, posteriormente, revogada pela própria ANS.
“A coparticipação não é um mal em si mesma. O consumidor precisa entender, contudo, sobre quais serviços ela incidirá. Não preocupa tanto que haja cobrança sobre consultas e exames, mas a cobrança sobre tratamentos crônicos e continuados, como tratamento para câncer ou doenças autoimunes, por exemplo, pode levar o consumidor, mesmo com plano de saúde, a ter que se valer do SUS”, alerta Elton Fernandes.